25 março 2011

black clothes can make you shine

De repente, os seus olhos fixavam as roupas pretas que cobriam o corpo do rapaz, com cabelo negro a cair-lhe pelos ombros; e se nao eram negros, eram de um castanho bastante escuro, tal como os dela. Incrivelmente, sentiu-se presa a ele, que sentado no muro baixo balançava com o lápis pelo bloco branco, desenhado qualquer coisa que não conseguiu perceber o que era, pois a vidraça do café não a permitia ter uma visão nítida e completamente clara do pátio lá fora. Demorou-se a olhá-lo, sem se aperceber que o observava minuciosamente. Ele parecia tão compenetrado no seu trabalho; e ela tão presa a ele. Viu-o sorrir e inconscientemente sorriu também, sem se quer se dar conta de tal coisa. Depois voltou-se para a mesa, onde os seus amigos continuavam calados. Acendeu um cigarro e levou-o à boca, e quando estava a atirar o fumo para fora dos seus pulmões, cruzou o olhar com o rapaz que subira o rosto para poder olhar para si. Tremeu e, envergonhada, tentou disfarçar; não querendo dar a entender que também o perscrutava. Mas foi inevitável, pois as trocas de olhares começaram a ser mais que muitas; quando ela tirava os olhos dos amigos e ele largava o bloco de desenho. Que surreal, estaria mesmo a acontecer ou ela estava a sonhar? A verdade é que se sentia arder por dentro quando os olhos sombreados do rapaz sorriam para ela, e quase que podia sentir uma conexão interior com ele. Conexão interior? De onde é que houver tirado tal expressão? Ou era dos filmes românticos ou então das histórias encantadas dos romances escritos. Estava um turbilhão. Mas tinha que admitir que, por mais que estivesse a fazer um esforço, ela não conseguia despregar daquele rapaz mistério, que também parecia encantado com ela, pois muitas vezes dava com ele a observá-la. E ambos desviavam o olhar, quando intencionalmente os seus olhos se fixavam um no outro. Quando ia, mais uma vez, remexer no seu maço de tabaco, manteve o rosto caído, mas ainda assim foi capaz de o ver levantar-se do muro, para arrumar as suas coisas. Ele ia embora? Ia pois; mas a pouca coragem não a deixou levantar o rosto para poder ver os movimentos calmos e suaves dele. Ainda assim foi capaz de perceber e reparar, quase como num reflexo, que ele a examinou mais uma vez, antes de começar a caminhar. Aí, quando o viu afastar-se, pode finalmente erguer a sua face. Mas, por estranha coincidência, virou o seu tronco em direcção à porta do café, por onde acabava de entrar o rapaz tão misterioso e com traços tão delicados. Não evitou, e seguiu-o com os olhos, completando-o. Quando não mais o vi, voltou-se para os amigos, que permaneciam em silêncio. Por mais que quisesse, não conseguiu apagar o rapaz do seu pensamento. Seria possível? Talvez. Sabia sequer o nome dele? Absolutamente que não. Tinha ideia de como o poderia encontrar, para além daquela noite? Provavelmente, mas sem grandes certezas. Queria conhecer o que escondia o rosto com barba por fazer, o sorriso doce, os olhos penetrantes; queria descobrir o que guardava o rapaz das roupas pretas? Sem dúvida. Estava enfeitiçada, de uma maneira absurdamente surreal e inacreditável.

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